Apontando a culpa à toda sociedade guineense
Militares negam ser os causadores de conflitos
A Comissão Organizadora para a realização da Conferência Nacional “Caminhos para Consolidação da Paz e Desenvolvimento” vai concluir, no próximo fim-de-semana, as conferências sectoriais que tem estado a levar a cabo na área de Defesa e Segurança desde o passado dia 14 de Dezembro. A Comissão vai reunir com os militares e paramilitares da capital depois de terminar consultas no interior do país.
Entretanto, depois de auscultar os homens do Norte e Leste, a Comissão encontrou-se, nos dias 7 e 8 de Janeiro, na cidade de Buba, com as forças de Defesa e Segurança da Zona Militar Sul, composta pelas regiões de Tombali, Quínara e Bolama/Bijagós. Objectivo é o mesmo: identificar as causas dos “sucessivos conflitos” no país e apontar as possíveis soluções para os mesmos.
Ao contrário do que aconteceu por exemplo com as forças do Norte, os militares da Zona Militar Sul não concordam que a classe castrense seja a principal causadora de conflitos na Guiné-Bissau, apontando a culpa à toda sociedade guineense.
Excepto esta questão, as constatações são quase as mesmas em relação aos dois anteriores encontros no sector: a injustiça, a falta de condições nos quartéis (alimentação, medicamentos, fardamentos e outros), a discriminação na atribuição de patentes, a impunidade, o desprezo, entre outras. Dizem também que nem sempre o chefe de Estado-Maior General das FA é da confiança do Presidente da República, o que acaba sempre por constituir um perigo.
Apontam ainda a forma como o nosso mar é explorado como uma das causas do conflito, pois segundo eles, nem todos os guineenses beneficiam com a exploração dos recursos haliêuticos. E acreditam que as FA devem ser vistas como um braço de desenvolvimento do país.
Um veterano do exército guineense anotou também como causa, a graduação de todos os autores do caso 17 de Outubro de 1985 e de 7 de Junho de 1998. “E todos esses autores de muitos casos ficaram impunes. Não se deve promover aqueles que criam conflitos”, acrescentou.
Alguns militares acreditam que a independência nacional foi mal preparada, ou seja, o país não estava apto para tal. “As Forças Armadas criaram o Estado da Guiné-Bissau ao contrário do que acontece noutros países do mundo, onde o exército é criado pelo Estado”, disse um agente. Ele acrescentou pedindo a aprovação de uma lei de condição militar como forma de prevenir conflitos.
Como outras soluções para conflitos, os homens da Zona Militar Sul apontam o diálogo, a reforma condigna no sector da Defesa e Segurança, a aplicação da justiça, assim como o combate à impunidade. A regularização e a organização das FA e da Administração do Estado foram outros dos elementos indicados.
Principal prevenção de conflitos
Falando no encerramento deste encontro, o presidente da Comissão Organizadora para a realização da Conferência Nacional “Caminhos para Consolidação de Paz e Desenvolvimento” afirmou que o diálogo é uma das principais soluções para os conflitos na Guiné-Bissau, aconselhando que não deve existir somente intriguistas na sociedade, os quais têm sido “elementos nefastos” ao país.
Manuel Sirifo Nhamadjo, que falava na presença do ministro da justiça, Mamadu Saliu Jaló Pires (um dos elementos da comissão), e da governadora da região de Quinara, Satú Djassi, garantiu que sai de Buba confiante de que os objectivos pretendidos com a reunião foram alcançados, e que todos vão empenhar-se no combate aos males, rumo ao desenvolvimento. Pediu aos participantes a serem transmissores das mensagens sobre o diálogo.
Ele manifestou-se satisfeito com as diferentes intervenções dos participantes, a quem disse terem noção de responsabilidade e de conhecimento geral sobre os problemas da Guiné-Bissau. “Temos a certeza de que, se continuarmos neste caminho, por mais difícil que sejam as divergências entre nós, vamos poder sentar e conversar. A solução dos problemas mesmo depois de tiroteios será sempre ultimada com diálogo. Só conversando é que se pode esclarecer muitas coisas resolver muitos problemas”, aconselhou.
Este responsável garantiu aos conferencistas que vai fazer chegar as suas mensagens às conferências regionais e nacional, e que as suas palavras farão parte de instrumento de trabalho da Comissão.
No entanto, o presidente da Comissão Organizadora da Conferência Nacional pediu aos guineenses a esforçarem-se no sentido de a Guiné-Bissau readquirir o nome que tinha antigamente: - Guiné-Bissau pikinino na tamanhu, garandi na fama. Mas para isso, adiantou, cada cidadão tem de dar o seu contributo nesse sentido, até porque “não há relação de respeito entre nós”
Sirifo Nhamadjo fez questão de lançar, entre outras, as seguintes perguntas: porquê é que há mais oficiais nas Forças Armadas do que soldados e praças? Porquê é que os polícias de trânsito se comportam como régulos? Por que razão os guardas-fiscais e guarda-florestais também têm tal tipo de comportamento?
Sem querer dar lição de moral, considerou que estão-se a promover desmandos, impunidade, sendo mesmo que outros acham estar em cima da lei. É por isso que, na opinião de Nhamadjo, promove-se injustiça, visto que quem não participa “nas confusões” não é promovido, e não se está a respeitar a carreira nas FA e na Segurança.
E chamou a atenção de que nenhum Governo pode desenvolver o país se não eliminar os referidos fenómenos. Tal como dizem os militares, este parlamentar também partilha a responsabilidade para toda a sociedade guineense, na medida em que ninguém faz denúncia quando vê algo errado.
Por seu turno, a governadora da Região de Quinará, Satú Djassi, declarou que esse tipo de trabalho era muito indispensável, porque há necessidade de se sentar e conversar. Reconheceu que o trabalho dos militares é difícil visto que estão nas casernas sem condições, mas mesmo assim pediu que estes tenham pena das mulheres guineenses que, sistematicamente estão de luto por falecimento dos maridos em conflitos.
A responsável regional disse que a violência não deve ser solução para a pobreza na Guiné-Bissau, exortando aos homens de armas a evitarem criar conflitos. Informou que a relação entre militares, paramilitares e a população civil é boa no sul do país, pelo que o processo de reconciliação está num bom caminho e irão com ele até ao fim.
No total foram 100 homens (50 seguranças e 50 das FA) com que a Comissão se reuniu no Sul. Seis porta-vozes, três de segurança e outros tantos da defesa, foram escolhidos para representar a Zona Militar Sul na conferência regional, tal como aconteceu no Norte e Leste.
Ibraima Sori Baldé